Extensão da carência no FIES para médicos residentes: STJ fixa limites à concessão do benefício
- Postulandi Petições
- 10 de jun.
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O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o AgInt no REsp 2.123.826-PE, firmou entendimento relevante sobre a possibilidade de extensão da carência no contrato de financiamento estudantil (FIES) para médicos residentes.
De acordo com a decisão, a concessão do benefício da carência estendida e a suspensão do pagamento das parcelas, em virtude da adesão a programa de residência médica, só são possíveis quando o contrato ainda não tiver ingressado na fase de amortização da dívida.
A controvérsia
O caso envolveu a análise da pretensão de um médico residente que buscava a extensão da fase de carência do FIES, com a consequente suspensão da obrigação de pagamento das parcelas já em curso.
O FIES é um programa do Ministério da Educação (MEC), criado pela Lei n. 10.260/2001, com o objetivo de financiar cursos de graduação em instituições privadas de ensino superior, com condições facilitadas de pagamento.
O contrato firmado no âmbito do FIES é regulado predominantemente por normas de direito público, cuja execução e interpretação devem respeitar o princípio da legalidade, sobretudo quanto às fases contratuais rigidamente previstas em lei.
As fases do contrato do FIES
A legislação estabelece três fases distintas no contrato de financiamento estudantil:
Fase de Utilização: corresponde ao período em que o estudante frequenta o curso, utilizando-se do financiamento e pagando apenas os juros incidentes.
Fase de Carência: inicia-se após a conclusão do curso e, como regra, dura até 18 meses, período em que o estudante continua pagando apenas os juros, enquanto se prepara para quitar a dívida.
Fase de Amortização: ao término da carência, inicia-se o pagamento do saldo devedor, com parcelas destinadas à quitação integral do financiamento.
A possibilidade de extensão da carência para médicos residentes
A Lei n. 12.202/2010 acrescentou o art. 6º-B, § 3º, à Lei n. 10.260/2001, possibilitando a prorrogação da fase de carência para graduados em Medicina que ingressem em programas de residência médica.
Contudo, a extensão está condicionada ao preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos:
Ser graduado em curso de Medicina;
Optar por programa de residência médica credenciado pela Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM);
Estar matriculado em programa considerado prioritário conforme ato do Ministro da Saúde.
Importante destacar que, conforme interpretado pelo STJ, essa extensão significa apenas ampliar o período da carência já vigente, não sendo possível reabri-la ou restabelecê-la caso o contrato já tenha evoluído para a fase de amortização.
A tese firmada pelo STJ
O STJ ressaltou que, uma vez iniciada a fase de amortização, não há amparo legal para suspender o pagamento das parcelas ou estender a carência. A aplicação do benefício pressupõe que, ao tempo do ingresso no programa de residência médica, o contrato ainda esteja na fase de carência.
Em outras palavras, a extensão só é válida se o médico residente fizer o pedido antes do encerramento da carência e do início da amortização.
Assim, decidiu-se que:
No contrato de financiamento estudantil - FIES, a concessão do benefício da carência estendida e a suspensão do pagamento das parcelas, em virtude da adesão a programa de residência médica, só é possível quando o contrato não tiver ingressado na fase de amortização da dívida.
Fundamentação da decisão
O STJ enfatizou que o contrato do FIES, sendo um instrumento jurídico-legal, não comporta flexibilizações que contrariem o regime jurídico previsto em lei. A extensão prevista no art. 6º-B, § 3º, da Lei do FIES, visa evitar que o estudante médico inicie o pagamento das parcelas enquanto realiza residência, mas não permite que a amortização, uma vez iniciada, seja suspensa ou revertida.
A Ministra Regina Helena Costa, relatora do recurso, destacou que:
"Tem-se que o art. 6º-B, § 3º, da Lei n. 10.260/2001 permite a extensão do prazo de carência, e não sua reabertura, porquanto apenas é possível estender o que ainda não restou findo".
Portanto, é imprescindível que o estudante requeira a extensão da carência antes do início da amortização, sob pena de perder o direito ao benefício.
Inteiro teor da decisão (conforme informativo do STJ)
Trata-se de controvérsia em torno da pretensão de extensão da carência para médicos residentes em contrato de financiamento estudantil - FIES. O FIES, programa do Ministério da Educação regido pela Lei n. 10.260 /2001, com suas alterações, destina-se ao financiamento de graduação na educação superior de estudantes matriculados em instituições não gratuitas, visando o fomento da qualificação profissional. Por meio dele, os alunos firmam contratos de financiamento com instituições financeiras, com juros reduzidos, cuja celebração e execução regem-se preponderantemente pelo regime jurídico de direito público, tendo suas principais cláusulas e fases disciplinadas em lei, devendo ser interpretado, dessarte, à luz do princípio da legalidade. À vista desse contexto, tem-se limitada a autonomia da vontade das partes contratantes, as quais devem respeitar as três fases contratuais legalmente estabelecidas. Na primeira fase, denominada de utilização, o beneficiário encontra-se estudando e fazendo uso do financiamento de forma regular, pagando apenas o valor referente aos juros. No período posterior, que tem início após a conclusão do curso e com prazo, como regra, de 18 (dezoito) meses, intitulado fase de carência, o estudante concluiu o curso e vai se preparar para o início da quitação do financiamento, cabendo-lhe, apenas, o pagamento dos juros. Por fim, na fase de amortização, após o período de carência, são pagas as parcelas do saldo devedor, oportunidade na qual o beneficiário estará obrigado a quitar integralmente o valor financiado, até que o contrato seja liquidado. Especificamente quanto aos estudantes de Medicina, o art. 6º-B, § 3º, da Lei n. 10.260/2001, incluído pela Lei n. 12.202/2010, estabelece a possibilidade de prorrogação da fase de carência. Permite-se, assim, a extensão do período de carência para além do prazo de 18 (dezoito) meses previsto no art. 5º, inciso IV, § 1º, da Lei n. 10.260/2001, desde que preenchidos os seguintes requisitos: a) ter o estudante sido graduado em curso de Medicina; b) optar por programa de residência credenciado pela Comissão Nacional de Residência Médica; c) estar o programa de residência médica definido como prioritário em ato do Ministro da Saúde. Tem-se que o art. 6º-B, § 3º, da Lei n. 10.260/2001 permite a extensão do prazo de carência, e não sua reabertura, porquanto apenas é possível estender o que ainda não restou findo. Assim, a aplicação do dispositivo em comento pressupõe o ingresso em curso de residência médica antes do término da fase de carência, daí por que, uma vez iniciada a fase de amortização, inviável a aplicação do benefício. Em outras palavras, a extensão da carência somente é possível se o contrato de financiamento estudantil não tiver ingressado na fase de amortização, quando do requerimento pela parte interessada aprovada em programa de residência médica.
AgInt no REsp 2.123.826-PE, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 28/4/2025, DJEN 7/5/2025.
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